quarta-feira, março 14, 2007

Para quem me quiser voltar a aturar a falar sobre cinema...


Em "About Schmidt" ressalta desde logo, sempre, em constância supreendente, o talento inato de Jack Nicholson, com subtileza, com excessos, com expressividade ou indiferença, enfim, tudo naquela justa medida que o torna, quanto a mim, um dos melhores actores de sempre. Ou então, como dizia um amigo meu, este homem mesmo que o queira não sabe ser um mau actor...
De resto, um filme interessante, de digestão fácil e momentos de fina comédia, contando com um argumento sólido e aquela mestria que só este senhor nos pode trazer.


Em "Children of Men", por outro lado, ressalvei o trabalho de câmara e a fotografia daquela Londres futurista, negra e profundamente desesperante face aos sentimentos que despertam na humanidade em 2027. Alfonso Cuaron, o realizador, foi curiosamente o produtor de "El Labirinto del Fauno", e pertence à recente armada mexicana que invadiu a edição deste ano dos Óscares. Neste contexto, a Academia também nomeou esta fita para três categorias, fotografia, edição e argumento adaptado. Há história, há reflexão, um Michael Caine em bom estilo e um Clive Owen convincente. Ao contrário do desenlace, infelizmente... De qualquer forma, temos qualidade e pelo menos duas soberbas cenas de acção que vale a pena reter...

terça-feira, março 06, 2007

SNS parte II


Terça-feira de manhã, ligo para o hospital, na esperança de falar com o gastroenterologista que acompanha o processo da minha avó…

“- Hospital!” (mas que bela maneira de atender...)

“- Estou sim, bom dia, estou a ligar por causa da minha avó, ela fez uma gastrostomia há cerca de 2 meses aí no hospital e agora parece ter havido uma complicação, gostaria de saber se é possível falar com o médico que a acompanhou…”

(interrupção brusca)

“- Só um momento, vou passá-lo para alguém das urgências…”

(ouve-se música irritante)

“- Estou sim, serviço de urgência.”

“- Bom dia, é o seguinte, a minha avó teve um problema com a gastrostomia que realizou há pouco tempo, eu gostaria de falar com o gastroenterologista…”

(nova interrupção, esta menos brusca um bocado…)

“- Peço imensa desculpa, a minha colega enganou-se a transferir a chamada, vou passá-lo para o serviço indicado…”

(música irritante)

(após uns bons minutos de espera – eu sei, sou um gajo paciente – ouve-se nitidamente o som de quem levanta o telefone para imediatamente o desligar outra vez)

(mais alguns segundos…)

“- Sim?” (voz familiar)

“- Estou sim, eu gostaria de falar com o gastro…”

(3ª vez que me interrompem)

“- Eu não acredito, peço imensa desculpa, voltaram a transferi-lo para as urgências, só um momento”

(música irritante, paciência a esgotar-se…)

(um minuto depois, finalmente, alguém atende…)

(ruído de fundo…)

“Oh Aaana!....Sim?”

(pela enésima vez, repito a lengalenga, cada vez mais resumida…)

“- Sim, bom dia, eu gostaria de falar com o gastroenterologista que está a seguir a minha avó, houve uma complica…”

“- Como se chama o médico?”

“- Dr. J., não me recordo do sobrenome.”

“- Só um momento…”

(mais alguns segundos daquela fantástica música)

“- Exames especiais, bom dia…”

“- Estou sim, eu gostaria de falar com o gastroenterologista da minha avó, o dr. J.”

“- Dr. quem?”

“- Dr. J.”

“ - Ele não está”

“ - Não está?!”

“- Não, nem hoje nem amanhã…”

(vontade de espancar alguém)

“- Hmm…ok, muito obrigado…”

(fim da chamada)

E já nem falo da linha azul do hospital, essa nem sequer funcionava. Passo a transcrever o que vem na folha de instruções fornecida à família após a cirurgia a que a minha avó foi sujeita: “em caso de complicação contactar imediatamente o médico”. I rest my case…

segunda-feira, março 05, 2007

Il labirinto del fauno


Simples e belo... Como tudo na vida deveria ser...
PS. Uma palavra para ti, bem sabes porquê... :) enjoy it*

sexta-feira, março 02, 2007

Divagações cinematográficas...

Quando falamos de cinema, pelo menos para um aprendiz de apreciador da arte como eu, falamos essencialmente da criação de atmosferas. Só agora tive a oportunidade de ver “Batman Begins”. O DVD andava para aí perdido no meio das revistas, whatever. Mas tenho que admirar o trabalho de Cristopher Nolan. Se realmente o objectivo é a construção de ambientes que nos envolvam, então todo o mérito ao homem que nos havia já surpreendido com a mestria de “Memento” e “Insomnia”. É fantástica a recriação de Gotham City, cinzentona, corrupta, alicerçada nos padrões do crime que mais tarde Bruce Wayne acaba por interiorizar, por meio de um processo de aprendizagem nunca antes visto em Batman, bem mais negro do que a fantasia dos vilões da comic book ou a despropositada feminilidade de Robin, o fiel compincha que aparecerá em aventuras subsequentes. Aqui o verdadeiro companheiro de Bruce é o mordomo Alfred, mostrando aquela sobriedade a toda a prova do grande actor que é Michael Caine. Mesmo a preparação para as seguintes aventuras do herói é extremamente bem feita. E depois aquela frase: “It's not who I am underneath, but what I do that defines me…” Absolutamente rendido.



E já que rebusco a temática, permitam-me uma curta opinião sobre os Óscares 2007. Com toda a sinceridade, gostei que “The Departed” tenha vencido. Não vi ainda “Letters from Iwo Jima” nem “A Rainha”, mas julgando pelo que me sobra, o filme de Scorcese pareceu-me, considerando as limitações do género no que aos gostos da Academia diz respeito (tem sido mais bonito dar o prémio a dramas, claro está), à vontade, o melhor.

Convenhamos, Clint Eastwood não podia ganhar mais um Óscar, já que tem essa pequena mania de tudo o que realiza ter nível para a estatueta, e a biografia da Rainha Isabel II, por muito boa que possa ser também, consagrará essencialmente a grandeza da actuação de Helen Mirren, justamente (pelo que dizem) galardoada com o título de melhor actriz principal. De “Little Miss Sunshine” guardei excelente impressão, pela subtileza com que aborda uma série de temáticas interessantes, sem nunca perder a leveza de uma boa comédia que por momentos nos consegue levar as lágrimas. Mas sendo o típico filme “indie”, dificilmente teria hipótese, até pela excelente consagração que já foi a estatueta de Alan Arkin como melhor secundário ou a nomeação da pequena mas talentosa Abigail Breslin. Quanto à obra de Inarritu, "Babel", junto-me facilmente aos muitos que dizem que este, sem ser um mau filme, tem sido certamente sobrevalorizado. Confesso que adorei o seu precursor na chamada triologia do medo, “21 gramas” (ainda me falta “Amores Perros”), e sendo assim, dificilmente acharia que este poderia alcançar o mesmo nível. Se o retracto das diferentes culturas, das falhas de comunicação ou do chamado efeito borboleta acabam por não estar mal gizados, a película parece caminhar para um desfecho que não existe, para uma hipotética conclusão que não convence ninguém. Uma bala perdida pode conduzir a um incidente internacional em ambiente pós-terrorismo, ok, a relação pais-filhos constitui-se de uma relevância primordial, sim sr, histórias em paralelo com um ponto em comum, óptimo, paisagens deslumbrantes relatando diferentes realidades pelo planeta fora, muito bonito. E o que isto nos traz de novo? Inarritu tem talento, sim, mas não pode fazer um filme como se de um prato novo baseado nos mesmos ingredientes de outras iguarias do passado se tratasse. O segredo não está certamente no que ele mete na panela, mas sim na maneira como o cozinha…



Quanto ao vencedor, bem, consagra finalmente a mestria de um dos melhores realizadores de Hollywood, que provavelmente já mereceria este prémio por realizações anteriores. Em “The Departed”, contudo, há uma intriga fantástica e que permite obter o máximo rendimento de excelentes actores. Não muito mais que isto, sim, mas de extrema qualidade. Nicholson é sublime. Aliás, quanto a mim, uma das grandes injustiças da Academia foi não o ter incluído no lote dos nomeados, bem como a “Blood Diamond”, um filme que consegue realmente arrebatar (a cena do reencontro de Solomon com a família no campo de refugiados é uma pérola, para além da que dá origem à intriga), contando com excelentes interpretações de Djimon Hounsou e de um Di Caprio cada vez mais maduro (como já havia acontecido no filme de Scorcese, começo a render-me…). De resto, da cerimónia em si, o que se esperava, tudo bem repartidinho, sem grandes ondas, com apresentadora a condizer, engraçada mas com moderação, não vá haver depois azia para aqueles lados (volta Jon Stewart, estás perdoado…). A reter a fantástica entrada em cena de Jack Black, Will Ferrell e John C. Reilly. Para o ano há mais.